Acredito que o setor mais delicado onde atuamos no hospital da PUC em Campinas é a UTI Pediátrica. Podemos perceber o quanto os profissionais da saúde são concentrados no que estão fazendo, já vimos diversos momentos em que a equipe se reúne para discutir casos ou para botar a mão na massa, em alguns leitos.
Cada vez que vamos lá, pisamos em ovos. Vamos devagar, sentindo cada contato, fazendo um raio-x de todos os movimentos, cada detalhe conta. E se percebemos o menor sinal de que não podemos entrar ou permanecer, nem pensamos duas vezes, apenas saímos e vamos para outro setor.
Dessa vez chegamos, e na entrada fica a salinha com os acompanhantes das crianças. Veio em nossa direção uma mãe que já conhecemos, temos uma ótima relação, já faz praticamente 8 meses que está lá. Sempre alegre, brinca, interage, provoca, cutuca. Jogo que palhaço gosta.
Mas dessa vez foi diferente, veio chorando, nos abraçou, disse que sua filha teria que fazer uma nova operação e que o estado é delicado. Escutamos, nos solidarizamos, procuramos acolher aquela dor, deixar ela fazer parte da nossa conversa.
O palhaço, como o pescador que está com sua varinha, concentrado no rio, verificando os sinais para pescar o peixe, aguarda, espera o momento certo. Assim foi, aos poucos fomos mudando os rumos daquela conversa, até que retomamos a nossa brincadeira, o Acerola deve doces para ela (não sabemos de onde surgiu isso, mas ela sempre pede, e nós nunca temos). Cada dia uma desculpa, ou uma nova proposta na verdade.
A energia da conversa começou a mudar, mudou o seu estado mental, ela riu em alguns momentos, aliviou a tensão, brincou um pouco com a gente e no final parecia diferente, saiu para dar uma volta, respirar.
Partiu, nos vimos depois, ela com ar mais leve, e nós com uma sensação inexplicável. A força desse trabalho é o que faz a gente acreditar no que fazemos.
Artista: Tiago Abad
Palhaço: Cirurgião Acerola
Cidade: Campinas
Hospital: Hospital da PUC
Mês: março – 2023
